sexta-feira, novembro 12, 2004

Querem destruir "A ESPANHOLA"

Exmo. Senhor Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo:

Somos um grupo de cidadãos de Viana do Castelo (e muitos que não são desta cidade), e vimos desta forma expressar a VªExª a nossa profunda tristeza ao constatarmos que um estabelecimento muito respeitado nesta cidade se encontra na eminência de ser encerrado por alegada falta de normas de segurança em vigor, sendo exigidas incomportáveis despesas de obras à proprietária do estabelecimento, uma senhora de 78 anos, viúva, que manteve esse estabelecimento como sustento durante 55 anos.

Esse estabelecimento é "A Espanhola", e a proprietária a Dona Otília. E pelo carinho e respeito que essa senhora de todos merece vimos apelar à sensibilidade de VªExª pelas seguintes razões:

-Reconhecemos que o estabelecimento com Alvará de 1950 não tem todas as normas de segurança exigidas pela actual legislação (tem extintores e porta de saída larga e aberta). Mas é um estabelecimento que esteve aberto durante 50 anos sem nenhum problema e em questões de segurança...será que a vida tem segurança? Serão as estradas seguras? Será que o amor é seguro?

-Em questão de higiene, basta ver as flores frescas, os tachos reluzentes, como só as nossas avós conseguiam por a brilhar, a casa de banho (embora apenas uma) sempre lavada de fresco, e a D. Otília sempre cansada de tanto limpar...

-Esta casa vianense é uma tasquinha à antiga portuguesa, uma casa da mariquinhas, e que quem viaja por este país encontra ainda em tantas cidades. Quem de nós não conhece tantas tasquinhas destas na Ribeira do Porto, na Baixa de Coimbra, em Lisboa por Alfama, Mouraria ou Bairro Alto... só quem não viaja pelo seu país não as conhece iguaizinhas a esta.

-Numa época em que todos sabemos que a herança mais valiosa que poderemos deixar às gerações futuras são as raízes da nossa cultura para que a cultura prevaleça, a riqueza da nossa tradição, o valor do nosso património. Numa época em que em todas nas cidades mais desenvolvidas se preserva, conserva e se reconstrói o nosso património cultural, porque é a nossa história única que faz de nós indivíduos de um povo único, como podemos permitir, nós vianenses que se assim encerre em nome do progresso cinquenta anos da história desta cidade?

-Pelo estabelecimento da D. Otília já passaram os avós nos anos 50, passaram os pais nos anos 70, agora estão os netos.

Naquela casa vemos entrar doutores e engenheiros que por ali estavam nos tempos de estudante, miúdos da casa dos rapazes, patentes da Capitania, muitos professores de Porto e Braga, estudantes.

Ali já se encontraram estudantes e professores ou apenas turistas da Itália, Alemanha, França, Suécia, Holanda, todos eles levaram para os seus países fotografias com muito carinho da D. Otília, pois ela com todos sabe ser gentil.
Uma fotografia dela até está no poster de um encontro de estudantes holandeses.

-Esta senhora que durante 50 anos sobreviveu a trabalhar na sua casa, a servir bem os seus fregueses, pode acreditar que, se aos 78 anos a obrigarem a deixar a sua alegria no meio dos jovens e a obrigarem a vegetar sem nada para fazer como se fosse uma velha, a D. Otília morre de tristeza.

-E por fim, o nosso maior encanto e orgulho pela D. Otília: é ver todas as noites jovens e muitos jovens, entrarem e dizer: “- Boa Noite Dona Otília, está boazinha?” E a Dona Otília com o sorriso mais doce que se possa sonhar, a todos dizer: “Como está meu rico menino, está bom? estão ali os seus amiguinhos no vosso lugar!”, e a todos trata pelo nome.

Hoje que por tanto lado os nossos jovens correm tantos riscos, quase sempre por falta de uma mão que os segure, é dos momentos mais belos da vida ver aqueles jovens naquela casa terem boa educação, respeito e bom comportamento. A D. Otília é para todos, quando acarinha ou quando ralha, a avó ou a mãe que estão mais longe.

Por quem é mãe, concedemos à D. Otília o mestrado em Ciência da Educação, ou simplesmente...é a Avó de todos aqueles Meninos.

Por estes motivos Senhor Presidente, vimos apelar ao seu bom senso e sensibilidade, para que se algumas pequenas obras forem indispensáveis, que o estabelecimento possa ser abrangido por um qualquer programa Polis, pequenas obras, apenas para aguentar mais meia dúzia de anos até ao fim dos dias da D. Otília, pois quando ela já não estiver, o estabelecimento fecha.

Muitos jornalistas de televisão adorariam fazer uma reportagem sobre ele, valia a pena, é único, é uma casa portuguesa com certeza.

Exmo. Senhor Presidente da Câmara vimos apelar à sua boa vontade na defesa da cultura e património desta nossa cidade e principalmente pela boa educação e respeito dos jovens desta nossa cidade a D. Otília aconselha-se e recomenda-se na cidade de Viana do Castelo.

Um grupo de cidadãos de Viana do Castelo (e muitos sem o serem...)

De todos nós para a D.Otília, um beijinho do tamanho do coração que ela tem para todos.